No dia 29 de setembro aconteceu a VIII Parada pela Diversidade Sexual de Messejana, em Fortaleza/ Ceará, com o tema "Todas as vidas das periferias importam!".
Fui convidada a ser Madrinha da Parada. Nunca na vida me senti tão honrada e feliz. Dificilmente me sentirei. Nem mesmo se um dia for convidada a ser madrinha da parada de SP, da parada de São Francisco, me sentirei tão honrada e feliz como neste dia: na minha quebrada e com esta bandeira: "Todas as vidas das periferias importam!".
Quando recebi o convite escrevi este pequeno texto em minhas redes sociais:
em alguns momentos da história estadunidense poetas foram convidados para ler poemas nas sessões de posse de mandatos de presidentes (posso estar enganada, mas no brasil, fora temer!)- robert frost leu “the gift outright” em 1961 (jfk). maya angelou leu em 1993 “on the pulse of the morning” e em 1997 miller williams leu “of history and hope” (ambos nas sessões inaugurais de bill clinton). em 2009 barack obama convida a poeta e professora elizabeth alexander que lê “praise song for the day”; em seu segundo mandato, convida o poeta de ascendência cubana e homossexual assumido richard blanco que faz a leitura de um dos maiores poemas da história (que logo mais publico na @escamandro), escrito propositadamente para a cerimônia.
é claro que eu não recebi convite de presidentes. minha presidente é uma mulher negra, sapatão, com maus dentes e que passa a vida em filas: em busca de emprego, saúde, educação e moradia. sou uma poeta periférica e anárquica. a analogia é: me sinto tão imensa quanto esse último poeta: de um país alvo de embargos, dito comunista e gay na escadaria do capitólio - no meu caso, uau: na messejana, resistindo e celebrando o orgulho de ser quem somos e poder amar quem amamos nessa terra em transe. uma poeta, numa festa. de nós, por nós! 🌈💕
E assim foi! Uma festa linda, de resistência, re-existências, afirmação e amor! Deixo abaixo a poema que li quando recebi a faixa e algumas fotografias desse dia histórico. Viva!
*
Minha história é a história
das quase 400 mil pessoas
Que vivem em favelas em
Fortaleza
Minha história é a história
das Mães do Curió e da Messejana
De todas as mães que perderam
seus filhos
Pelas mãos assassinas da
polícia e seu estado
É a história das meninas que
cedo aprendem que têm que fechar as pernas
A ter medo de andar sozinha,
de uber, a ter medo de homem e de
farda
E que a cor da pele é passe e é
passagem
Minha história é a história de
Carol, espancada até a morte por ser lésbica
É a história de Dandara, apedrejada,
humilhada, executada.
Minha história é a história
das 10 mil pessoas que estão aqui hoje
Nossa história foi filmada
pelo Barra Pesada, pelo 190
Numa narrativa que nos colocam
como culpadas, culpadas, culpadas!
Dieguim da Serrinha diz bem:
“Quero ver filmar um sarau e
botar em rede nacional”
Não somos assassinas!
Enquanto a parte alta da
cidade é consumidora de tudo
As periferias são produtoras
de tudo:
Hortas, batuques, bibliotecas,
dança, poesia
Somos tudo o que quisermos
ser!
Crianças fazendo dramaturgia e
teatro
Na Biblioteca Livro Livre
Curió
Brincando de bila, pipa,
estrela-canastra, esconde-esconde nos campinhos
Lendo nas praças, num clube de
leitura ou no silêncio do quarto
As donas Marias vendendo coco
na praia, roupas pras vizinhas
Ou fazendo as unhas das
amigas, de Dona Conceição Evaristo
Somos tudo o que quisermos ser
Arquitetas, advogadas,
médicas, faxineiras, putas
Minas, Manas, Monas,
Sapatonas, Bixas, Travas, Mariconas, Mariquinhas
Loucas, Travessas! Transviadas! Somos
Gente! Somos Nossas!
Nunca mais desgraçadas, nunca
mais açoitadas,
Nunca mais marginalizadas,
nunca mais destruídas!
Eu poderia explodir o mundo
com a fúria que carrego no corpo
Fúria legítima por séculos de
violência com nossa gente, com nossa história
Somos gente, somos nossas e
nossas vidas importam sim!
Todas as vidas das periferias importam!
E vamos lutar por elas com as unhas, com os dentes, com poemas, com festa!
*
<3
1 comentários:
A militância e resiliência de sempre.
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